Ainda em março do ano passado, com o decreto do estado de pandemia global pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e os efeitos decorrentes sentidos no Brasil, surgiu uma grande preocupação com a possibilidade de as empresas serem responsabilizadas em caso de os funcionários serem contaminados pelo novo coronavírus.
A preocupação não era para menos: era uma situação inédita, que não somente passou a afetar a forma como vivemos, mas também a forma como trabalhamos. Com muitas empresas sendo obrigadas a suspender suas operações, a preocupação do momento era (aliás, até agora é) exercer todo o tipo de cuidado possível.
A posição inicial do governo também foi de preocupação. Com a Medida Provisória 927 (aquela mesma que autorizou a adoção do teletrabalho sem anotação na Carteira de Trabalho, concessão de férias individuais e coletivas sem aviso prévio, antecipação de feriados, etc., que o Congresso não votou e perdeu a validade), houve uma tentativa de dificultar a configuração da contaminação por Covid como doença ocupacional, obrigando que fosse demonstrada a relação que a empresa teria com a contração da doença.
Ainda assim, a Medida Provisória era muito genérica e não havia um procedimento oficial a ser seguido. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou esse trecho da medida provisória, por considerar que isso desprotegia os trabalhadores.
Dias depois, a Secretaria Especial do Trabalho e da Previdência e o Ministério da Economia estabeleceram, conjuntamente, uma instrução normativa determinando quais os procedimentos que deveriam ser adotados para prevenção do contágio de coronavírus, tais como a obrigatoriedade de fixação de instruções de etiquetas de higiene (distanciamento, uso de máscaras e álcool gel, etc.), bem como orientar (treinar) a equipe para se proteger.
Provavelmente, sua empresa parceira de segurança e medicina ocupacional lhe auxiliou na época com a elaboração de cartazes e instruções neste sentido, inclusive tratando o fornecimento de máscaras e álcool gel como Equipamentos de Proteção Individual, bem como muitos funcionários já foram positivados e foram afastados para não contaminar os colegas.
Espero, inclusive, que você e sua equipe estejam bem. Muitos brasileiros, infelizmente, não sobreviveram aos sintomas da doença.
Vamos, então, ao que interessa: explicar o porquê da decisão da Justiça do Trabalho de Minas Gerais em condenar a empresa a indenizar a família de seu funcionário que faleceu por complicações da doença¹, tanto para pagamento de pensão à viúva e a filha do funcionário, como também para indenização por danos morais, fixada em R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).
O motivo, na verdade, é simples: a empresa não conseguiu comprovar que adotou todos os procedimentos necessários para evitar que o funcionário fosse contaminado.
O funcionário em questão, que exercia a função de motorista, passou a apresentar sintomas por volta de maio do ano passado, vindo a falecer logo depois.
Do ponto de vista da Justiça, as provas da empresa foram insuficientes para afastar a responsabilidade, vez que ele compartilhava o veículo com outras pessoas, tendo uma testemunha afirmado que estranhos manobravam o veículo quando necessário, sem haver registro de que a cabine do caminhão era toda vez higienizada quando isso acontecia, o que é um protocolo necessário para o posto de trabalho onde pessoas se revezam.
Ou seja, a empresa não tinha se organizado e documentado de forma suficiente a adoção dos protocolos exigidos pelo poder público e, por isso, foi responsabilizada de forma objetiva (independentemente de culpa) pelo aconteceu.
Em resumo, esse foi um caso que poderia ter sido evitado se a empresa tivesse se atentado ao necessário para proteger a sua equipe.
Portanto, não há razão para preocupação se tua empresa vem adotando as recomendações de prevenção de contágio do novo coronavírus, mas é sempre bom ficar atento se isso vem sendo seguido à risca, pois muitos casos judiciais estão surgindo por conta deste problema.
E aí você pode estar pensando: Ok, Ronaldo, a gente sabe que na Justiça do Trabalho é praticamente impossível ter um resultado positivo em um caso desses. Pois bem, eu discordo.
Uma empresa aqui do Rio Grande do Sul que comprovou ter adotado as medidas que mencionei ao longo do texto, venceu um processo movido por um ex-funcionário ao demonstrar cabalmente que o mesmo recebeu o treinamento e os equipamentos de proteção individual necessários², por meio de sua organização e zelo.
Organização e zelo: É o que eu chamo de Direito Laboral Preventivo na prática.